O Professor e a
Maldição dos Pronomes
Como todo professor sabe, algumas
vezes alguns alunos resolvem não dar as caras na aula. A probabilidade de isso
acontecer é ainda maior quando se trata de aulas particulares. Nesses casos,
podemos ficar sossegados em nossas salas com um bom livro, podemos preparar
aulas futuras ou corremos o risco de ajudar algum aluno que precise de reforço.
Pois é sobre esse último caso que farei um triste relado que aconteceu comigo
recentemente.
Tratava-se
de um garoto no nível básico de inglês que precisava de mais explicações sobre
verbo to be e pronomes. “Maravilha”, pensei comigo mesmo. Pensei que o garoto
tivesse apenas perdido as primeiras aulas e que seria rápido dar alguns
exemplos e pedir que fizesse alguns exercícios. Como estava enganado!
Algumas
perguntas fáceis, como “what’s your name?” e “where are you from?”, ele tirou
de letra – provavelmente porque são perguntas marteladas durante os três anos
de colegial (chamam de ensino médio hoje em dia, certo?).
Certo,
vamos revisar os pronomes pessoais e possessivos. Para facilitar a vida do
garoto fiz uma tabelinha e a coloquei no quadro. Só para você não ficar um
pouco perdido, aqui vai a tabela:
I – My
You – Your
He – His
She – Her
It – Its
We – Our
You – Your
They –
Their
Então escrevo no quadro: What’s
your name?
– Como você responde a essa
pergunta? – pergunto-lhe.
– My name is… – não me lembro o
nome do garoto.
– Certo, agora como perguntamos
“qual é o nome dele”?
O garoto olhar o quadro com olhos
vazios. Encosto-me na parede, dando-lhe um pouco de tempo para pensar. Após
alguns instantes de silêncio incômodo, eu tento ajudar.
– Como eu falo “ele”?
– He – ele rapidamente me
responde.
– É isso aí – eu o encorajo. –
Então como digo “dele”?
– There – ele responde sem
pestanejar.
– Não. Olha a tabela. Qual é o
pronome possessivo equivalente ao “He”?
Ele demora um pouco consultando a
tabela, afinal de contas é uma tabela bem grande. Depois de alguns instantes
ele responde:
– They!
– Não.
– Where!
– Não – e penso comigo mesmo: “ ‘where’
sequer está na porcaria da lista!”
– Então não lembro.
Não lembra? Não lembra?! Como
assim, não lembra!?! Expliquei tudo um minuto atrás! Contudo, não deixo meus
pensamentos transparecerem na minha expressão. Respiro fundo mentalmente e
mostro-lhe a resposta correta. Muito bem, vamos a outro exemplo:
– Como pergunto “qual é o nome dela”?
– Não sei – ele responde, sem
pensar por um único, mísero segundo.
– Olha aí na tabela – digo com
uma paciência de causar inveja no próprio Dalai Lama. – Qual é o pronome
possessivo equivalente ao “she”?
– His!
– Não.
– They!
– Não – e nesse momento meu
cérebro já está imaginando diversas maneiras de espremer a cabeça dele através
das grades na janela.
– Where!
De novo? Nem na lista está a
porcaria do “where”! Mas ao invés de enfiar duas canetas orelha adentro para
cutucar o cérebro dele para ver se funciona, eu respiro fundo mentalmente de
novo e aponto-lhe a resposta correta.
E assim uma hora de aula se
desenrolou. Num certo momento, cheguei a me perguntar se no futuro, com a
tecnologia avançando cada vez mais, será possível realizarmos transplantes de
cérebro. Aquele garoto certamente seria um dos primeiros na fila de espera.
Após a aula, pensando com mais
clareza, fiquei em dúvida. O garoto tem enormes dificuldades ou simplesmente
tem preguiça de pensar? Uma geração que sabe fazer mágicas com computadores e
afins não consegue consultar uma simples tabela? Impossível! Acho que ele
ficava olhando para o quadro por tanto tempo porque estava se perguntando onde
ficava o botão que lhe mostraria a resposta.
Cada dia que passa, me deparo com
alunos assim. Alunos de todas as idades que têm preguiça de pensar e que ficam
impacientes se você não entregar a resposta de uma vez. Quanto mais tento
guiá-los na direção certa, mais eles fecham a cara e fazem biquinho de criança
mimada.
É por isso que não concordo com a
teoria da evolução de Darwin. Quer dizer, concordo em partes. Só acho que ele
errou na ordem; acho que o macaco veio do homem, e não o contrário.